Trazendo a análise das experiências imersivas voltadas para a temática da natureza, o projeto a ser analisado aqui será FLUXO, o primeiro espaço imersivo do Museu de Arte do Rio (MAR), exposto em 2019. Ele foi elaborado pelo estúdio Super Uber e consiste numa experiência de imersão que trabalha com a ideia do movimento fluido, natural, dos ciclos e das mudanças; com o fluxo, como o nome aponta. Fluxo da energia infinita e eterna que se conecta, se transforma e se canaliza tanto na natureza em si quanto no ser humano e no que ele produz a partir dela. Isso é perceptível no primeiro momento em que a sala é adentrada, quando o andar de cada visitante, reconhecido por meio das câmeras de profundidade instaladas, produz partículas dessa energia no piso num deslocamento inconstante, semelhante a um líquido, mas sempre criando uma conexão entre o visitante e o núcleo da sala. Nesse núcleo, imagens desenvolvidas pela equipe são projetadas por meio de softwares de mapping em paredões circulares, criando um verdadeiro espaço imersivo. Ali, é possível se posicionar do jeito que quiser, até mesmo deitando sobre os travesseiros no chão, e contemplar a manifestação dessa energia que se canaliza ininterruptamente em aspectos visuais e sonoros do natural, com tempestades, águas e constelações e seus respectivos sons, dos elementos de produção cultural humana ancestral, com padrões indígenas e africanos e sons de conga, maracás e pontos de candomblé, e da interação entre esses dois polos. O resultado é o florescer de uma verdadeira sensação de contemplação dessa energia e também de inclusão, de entendimento de como cada um faz parte do fluxo circular dela e contribui para que esse fluxo continue a se movimentar.
FLUXO me chamou a atenção primeiramente por ser um exemplo preciso e muito bem executado do que é uma experiência sensorial e de como ela funciona. É capaz de cumprir tanto com a proposta técnica que define este tipo de projeto quanto com a utilização destes recursos para alcançar o conceito desejado a se expressar aqui. Em relação ao conteúdo da instalação, me interessa particularmente o modo como as temáticas da energia, da natureza e da ancestralidade, tão afastadas da tecnologia à primeira vista, conseguem ser conectadas dentro do projeto justamente com este contexto digital e são apresentadas como uma forma única e cíclica. Isso não só explicita a inspiração principal do projeto que é justamente a cidade do Rio de Janeiro, onde o natural e o urbano convivem numa intensa e incessante troca, como também corrobora com a própria ideia que a experiência passa de interconectividade e com o objetivo do museu ao inaugurar esta sala de abraçar mais a interdisciplinaridade da arte, atraindo novos públicos.
Vale ressaltar aqui que eu fui um dos visitantes da sala em seu período de exposição no MAR. A experiência em si foi muito interessante e posso afirmar que foi capaz de ativar em mim um sentimento contemplativo intenso, comparável a um transe, desde o momento em que se percebe como você contribui para a movimentação da energia com seus passos até a contemplação da manifestação dessa energia observando, ouvindo, realmente se permitindo sentir como sendo parte indispensável à continuidade esse fluxo. Desse modo, o projeto conta com excelente infraestrutura, conceituação e execução, e a meu ver uma possível deficiência que poderia ser apontada, de um âmbito bastante pessoal, seria a questão de como a separação dos paredões que recebem o mapping e a projeção das imagens criam uma quebra destas últimas de forma brusca e que comprometem de certo modo a observação delas de um ângulo geral e a integridade. Como saída disso, sugeriria uma saída simples e mais analógica: a colocação de cortinas, tecidos ou de artesanatos ancestrais pendurados, como contas, pedras e penas, elementos que estão imersos na narrativa, que suavizariam a transição entre as áreas projetadas e cujo movimento dos próprios materiais seria capaz de reforçar a estimulação da ideia da fluidez e acender nos visitantes a chama dessa noção de que, enquanto durar a estadia nessa imersão, eles são infinitos.
Todas as imagens foram retiradas do Google Imagens.
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